Protocolo, etiqueta e boas maneiras: o que os une? E o que os separa?

Por: Joana Andrade Nunes
04/01/2021

Protocolo,

Etiqueta e

Boas maneiras

são conceitos que, para o público em geral, significam exatamente o mesmo.

Esta “confusão” de conceitos é muitíssimo comum, o que dificulta a compreensão da essência de cada um e qual o papel que lhes está atribuído.

Quando menciono a palavra etiqueta, consigo visualizar uma luz de alerta que se liga, de imediato, no cérebro de cada aluno.

Numa primeira abordagem, a resposta da maioria dos meus alunos é similar: “etiqueta é o conjunto de regras que se aplica apenas em ocasiões formais (em especial à mesa) e/ou reservadas a determinadas classes sociais.”

É um conceito que transporta consigo o peso do preconceito fruto da sua incorreta compreensão.

Por sua vez, falar em protocolo é, para muitos, falar em algo inútil para o cidadão comum; “são as regras que apenas se aplicam em cerimónias de Estado, Casas Reais ou entre diplomatas“, afirmam, inicialmente, os meus alunos.

E as boas maneiras?

Bem… “são (ou deverão ser) normas de conduta transversais a cada sociedade permitindo que todos possamos viver em harmonia“.

Dos três, este é o conceito que mais se aproxima da sua verdadeira definição (ainda que muitos apresentam comportamentos em sociedade que, claramente, demonstram que “faltaram a esta lição”.)

O que significa, então, cada um destes conceitos?

PRO.TO.CO.LO

A palavra protocolo – com origem na palavra grega “protokollon” (a primeira folha do rolo de papiro) – determina o conjunto de regras que devem ser observadas durante relações sociais e diplomáticas, tal como estabelecido no Congresso de Viena de 1815 e na Convenção de Viena de Relações Diplomáticas de 1961.

Em traços gerais, o protocolo visa criar o ambiente perfeito pautado pelo respeito. Desta forma, minimizam-se conflitos e ruído que surgiriam se este não existisse.

É o respeito que devemos demonstrar a cada um dos presentes num determinado evento/ocasião que, de acordo com as regras de protocolo baseadas no status de cada pessoa, determinará a precedência que esta tem.

No fundo, é saber quem tem prioridade, quem é a pessoa mais importante da sala; quem tem mais poder; quem é merecedor do nosso respeito e consideração em primeiro lugar.

É a forma de demonstrarmos respeito por cada membro de uma organização de acordo com o seu status: importância e poder.

Será que as regras protocolares são mesmo desnecessárias?

Porque é importante saber quem devo cumprimentar em primeiro lugar? Ou quem entra primeiro na sala? Qual a necessidade de saber onde me vou sentar?

A resposta é simples!

O protocolo retira “o peso sobre os ombros” da insegurança de não saber o que fazer; do inexpectável; de não saber qual é o seu lugar; de ficar ansioso e inseguro ao não saber quem deve (e como deve) cumprimentar em primeiro lugar.

O protocolo cria espaço para que as relações possam fluir; transmite segurança; permite que consigamos estabelecer relações sólidas e duradouras com segurança, tranquilidade e sem “ruído de fundo”.

O protocolo transforma o caos em ordem; transforma os medos e as inseguranças em previsibilidade e tranquilidade pois todos sabemos qual o comportamento a adotar.

O protocolo liberta-nos: permite-nos focar na relação que estamos a construir. 

Muitas regras protocolares foram formalizadas no Congresso de Viena — no qual os representantes de todos os Estados envolvidos nas guerras napoleónicas negociaram as condições para uma paz duradoura — em 1815 e na Convenção sobre as Relações Diplomáticas de 1961, não tendo sofrido grandes alterações desde então.

E a etiqueta e as boas maneiras? O que são? Qual é o seu papel?

E.TI.QUE.TA

Na corte do Rei Luís XIV, instituiu-se a prática de distribuir folhas de papel a todos os que frequentassem as cerimónias em Versalhes contendo instruções sobre o comportamento que deveriam adotar, o local onde se deveriam sentar, entre outras. Essas folhas, chamadas de “etiquetas“, continham as regras de comportamento que todos deveriam observar na corte.

Naquela época, o Rei era o Estado e, por isso, Etiqueta e Protocolo coincidiam: a etiqueta era, de facto, o protocolo do Estado à data.

Contudo, atualmente, etiqueta e protocolo têm significados  e lugares distintos.

A etiqueta é o conjunto de regras que nos permite demonstrar respeito, consideração e amabilidade para com todos os que nos rodeiam. É o conjunto de sugestões normativas que nos permite adotar um comportamento educado e gentil para com todos vivendo em harmonia em sociedade.

Contudo, as regras de etiqueta não têm de ser coincidentes com as regras de protocolo.

Socialmente, a mulher passa à frente do homem; quem tem mais idade, passa à frente de quem é mais jovem.

Quando as regras de protocolo entram em ação, o que vai determinar a importância de cada um é a sua posição dentro de uma determinada organização e não a sua idade ou o seu género.

Como tal, uma mulher com uma categoria inferior naquela organização (ou seja, com menos importância e com menos poder), não passará à frente de um membro mais sénior (seja ele do sexo masculino ou feminino); um membro mais jovem da organização – mas com um cargo mais elevado, ou seja, mais importante, com mais poder — terá primazia face a outro membro com idade mais avançada.

Tal como referi, o protocolo cria espaço para que as relações (entre Estados e organizações) possam fluir sem inseguranças ou receios; todos sabem qual a sua posição; todos sabem quem tem mais poder, quem tem mais importância possibilitando a construção de relações sólidas e duradouras sem “areias” a dificultar o seu funcionamento.

Se, tal como referi inicialmente, muitas regras protocolares foram formalizadas no Congresso de Viena e na Convenção sobre as Relações Diplomáticas de 1961 não tendo sofrido grandes alterações desde então, as regras de etiqueta variam de acordo com o contexto cultural e vão sendo alteradas de acordo com a evolução da sociedade.

Já reparou que a forma como cumprimentamos o outro não é igual em todos os países? E o local onde colocamos as mãos quando estamos à mesa, será transversal ao contexto ocidental?

Quando estamos à mesa no Reino Unido ou nos Estados Unidos, as mãos devem permanecer no colo mantendo-se apenas em cima da mesa a mão(s) que está a manusear o talher. Pelo contrário, em França e em Portugal, as mãos e os pulsos ( mãos e pulsos! os cotovelos jamais se colocam em cima da mesa!) devem estar sempre visíveis em cima da mesa, incluindo quando não estão a manusear os talheres.

É, por isso, muitíssimo importante saber interpretar as fontes que consultamos quando procuramos “aprimorar” a arte de saber estar e bem receber.

A título de exemplo, um manual de etiqueta elaborado no contexto inglês — por mais brilhante e completo que seja — não pode ser lido como contendo todas as regras que se aplicam no contexto português. A nossa cultura tem uma herança própria determinando regras de etiqueta diferentes para determinadas ocasiões.

Por fim, qual o lugar das boas maneiras?

BO.AS MA.NEI.RAS

As boas maneiras são, no fundo, as linhas de orientação que nos permitem socializar com o outro de forma educada, correta e agradável.

Respeitar o outro, ser gentil, generoso são o seu núcleo central que nos vai dar “a resposta” ao que fazer quando não sabemos qual a regra de etiqueta a observar.

“O nosso comportamento demonstra respeito, amabilidade, consideração e gentileza para com o outro?”

É a pergunta que devemos fazer, interiormente, quando não sabemos o que fazer em determinada ocasião.

Tal poderá determinar que, em certas ocasiões, as regras de etiqueta tenham de ceder para que estes princípios nucleares que dão vida às boas maneiras sejam observados.

Mas este assunto ficará para outras “núpcias”!

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